quarta-feira, outubro 04, 2006

Tragédia do Gol 1907: Triângulo das Bermudas Brasileiro?

A repetição de tragédias com aviões e helicópteros na região da Serra do Cachimbo, em Mato Grosso, já dá ao local o peculiar apelido de "Triângulo das Bermudas brasileiro". Em comum com o famoso trecho do Oceano Atlântico, a área onde houve o fatídico acidente com o vôo 1907 da Gol na tarde da última sexta-feira também funcionaria como uma espécie de ímã para acidentes fatais. A geografia do lugar e seu posicionamento no globo terrestre contribuem para a criação da lenda, que se espalha aos poucos entre os profissionais do setor e interessados na aviação civil. A Serra do Cachimbo estaria localizada sobre o equador magnético da Terra. Por conta disso, a região funcionaria como uma espécie de ímã, não de objetos, mas de íons, partículas eletricamente carregadas. De vez em quando, essa característica seria responsável pela formação de um fenômeno espacial chamado de "bolha ionosférica". Essas bolhas não seriam capazes de derrubar um avião, mas podem atrapalhar a comunicação de equipamentos eletrônicos por conta do ar carregado de átomos eletrizados.

O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) costuma usar a base da Força Aérea Brasileira (FAB) na Serra do Cachimbo exatamente para estudar esses fenômenos. Informações da assessoria do Inpe confirmam as possíveis interferências que essas bolhas poderiam causar. "A região da Serra do Cachimbo é importante para os estudos ionosféricos no território brasileiro, pois está situada no equador magnético, onde as irregularidades e bolhas ionosféricas são formadas e podem interferir nas ondas eletromagnéticas que se propagam através da região, degradando inclusive os sinais transmitidos pelos satélites GPS (Sistema de Posicionamento Global, em português)", explica a nota divulgada em 2005.

Teorias espaciais à parte, o acidente com o vôo 1907 entra para uma lista de graves problemas aéreos no local. Um dos primeiros sofridos por um avião comercial foi em 7 de dezembro de 1960, quando um avião da antiga companhia Nacional caiu na região, matando todos os seus ocupantes.

Em 1989, outra tragédia marcou a serra. Um Boeing 737-200 da Varig teve que fazer pouso forçado em meio à selva após uma falha do piloto na definição da rota da aeronave. Morreram 14 passageiros e 54 ficaram feridos, aguardando por socorro durante dois dias. No dia 5 de setembro do ano passado, um acidente nas redondezas com um avião monomotor Corisco deixou quatro feridos e duas vítimas fatais, entre elas um bebê de apenas sete dias. Isso aconteceu em Sinop, uma das cidades da serra, quando a aeronave transportava dois recém-nascidos junto com a mãe, que seria internada na maternidade da cidade, e a equipe médica. A FAB também tem registro de quedas em sua base de treinamento na região. Em novembro de 2002, um helicóptero se acidentou no campo de provas de Cachimbo, matando os oito tripulantes.

Muitos resistem em acreditar que haja algo inexplicável nas quedas de aviões em Cachimbo. A interpretação de pilotos que sobrevoam a região é de que a lenda sobre o lugar pode ter surgido apenas do difícil acesso ao socorro. "Já sobrevoei essa área centenas de vezes e a mata é muito fechada, o que dificulta quando há um acidente", conta o presidente da Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (Infraero), brigadeiro José Carlos Pereira. A quantidade de árvores e a dificuldade de encontrar uma área de pouso em caso de problemas pode ser o real motivo para os acidentes na região. Ao contrário de outras áreas, onde se poderia buscar um ponto para pouso forçado, um problema nas imediações da Serra do Cachimbo quase sempre é fatal.

O Triângulo das Bermudas é uma área imaginária do Oceano Atlântico, ao longo da costa sudeste dos Estados Unidos. Um dos vértices está nas Bermudas, nas Antilhas; o outro em Miami, na Flórida, e o terceiro, na cidade de San Juan, em Porto Rico. Nessa região, também conhecida como Triângulo do Diabo e Triângulo da Morte, teriam desaparecido, sem deixar rastro, 50 navios e 20 aeronaves. O caso mais famoso, do Vôo 19, ocorreu em 5 de dezembro de 1945. Cinco aviões de bombardeio (foto) da marinha norte-americana partiram de Fort Lauderdale, na Flórida, para uma missão rotineira de treinamento. As condições meteorológicas eram boas, todos os pilotos experientes. O tempo previsto de vôo era de duas horas. Mas eles nunca voltaram para a base. A aeronave que partiu para o resgate, levando 13 tripulantes, também desapareceu. As explicações para o fenômeno são as mais variadas. Vão de distúrbios no campo magnético da Terra a grandes bolsas de gás no mar e até rapto por extraterrestres.
Publicado originalmente no Correio Braziliense em 2 de outubro de 2006

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